segunda-feira

o inchaço

O inchaço das horas expande seu domínio. Estufa as veias dos minutos e faz o mundo parecer preenchido com salitre. Cada gesto prolonga uma intenção oculta, cada vez mais longe de desvelar-se. Os segundos afastam-se uns dos outros, estendendo os braços para alcançar os tique-taques vizinhos, subseqüentes ou pretéritos. Os cigarros viram cinzas e os pêssegos ameixas secas no porvir das esperanças postergadas. Anda o ponteiro e seca o copo. Toca o grande Pã sua flauta zéfira. Corre Mercúrio no firmamento. Mantém o mundo a crosta longínqua de ilusão e fantasia sobre a qual erigem-se os desertos mais radiantes de escarpas oblíquas. Eu sou uma pedra imortal que jamais viveu. O tempo é meu querer. Minha estória eu a escrevo na superfície do rio que corto. Em mim o potencial se converte em memória. Fora isso é o esquecimento. É como olhar para o mar quando está sereno; e é como olhar para o mar quando está atormentado. Não é a mesma coisa. É a mesma coisa. O que num momento parece múltiplo a outro instante é despido de multiplicidade. O fogo é o próprio graveto.

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